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2.7.23

Maria Quitéria

Maria Quitéria, a soldado Medeiros

Em 1822, Maria Quitéria de Jesus, uma mulher parda com traços indígenas, desobedeceu as ordens do pai e as convenções da sociedade e se alistou como soldado Medeiros para lutar na Guerra da Independência na província da Bahia.
 
Mesmo descoberta, seguiu no batalhão e foi confinada por dom Pedro 1° pelos seus feitos. Sua história hoje inspira a luta de mulheres por um país menos desigual.

 Até lá, uma resistência que estava na cidade de Cachoeira, no Recôncavo Baiano, organizou batalhões com voluntários para as lutas contra as tropas portuguesas na Bahia. Homens negros e pardos, escravizados e livres, formaram o Batalhão dos Periquitos. 
O nome remete à farda que usavam, que continha um dolmã azul-escuro com gola e punho esverdeado.
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Nesse batalhão, uma mulher se alistou como soldado Medeiros e comandou ao menos três batalhas que foram travadas para a vitória das tropas baianas. Seu nome era Maria Quitéria de Jesus.
Nascida em 1792 no sítio do Licorizeiro (numa região chamada de São José das Itapororocas, no Recôncavo Baiano), ela aprendeu desde cedo a cavalgar e a atirar com armas de fogo, razão pela qual se recusava a bordar, tecer, fiar e cuidar da casa , atividades costumeiramente destinadas às mulheres da época.
Por infortúnio do destino, viu sua mãe morrer quando ainda era muito jovem. 
Por conta disso, ela e a família se mudaram para outra fazenda, chamada Serra de Agulha. Por lá, seu pai, Gonçalo, se casou mais uma vez.

Ao ouvi-lo falar sobre as lutas pela Independência, ela se segurou e afirmou que gostaria de ir. 
Seu pai a repreendeu, afirmando que um campo de batalha não era lugar para mulher.
Ainda assim, não se deteve. 
No dia seguinte, fugiu escondida para a casa de sua irmã Tereza, a quem contornou seu plano. 
Iria se disfarçar de homem para lutar na guerra, visto que o alistamento não era permitido para mulheres. 
Cortou os cabelos e pegou emprestado a farda e o nome de seu cunhado, Medeiros.


A partir daquele momento, Maria Quitéria registrou para Cachoeira como soldado Medeiros e por lá se alistou. 
Da artilharia à infantaria, ninguém suspeitou do seu disfarce.
 Presença destacada entre os soldados das tropas baianas, a documentação demonstra que ela se apaixonou durante as lutas pela Independência do Brasil na Bahia, casando-se em março de 1821 com o furriel João José Luís, que morreu pouco tempo depois.

Na última batalha que comandou, Maria Quitéria e cerca de 40 mulheres entraram no rio Paraguaçu, nadaram até interromper com água à altura dos seios e lutaram contra os portugueses para que as barcas inimigas não chegassem à Baía de Todos os Santos.
O reconhecimento de seus feitos nas lutas pela independência política do Brasil na Bahia, no entanto, não suportou a preocupação por ter transgredido moral, estética e politicamente as ordens de seu pai e daquela sociedade que criminalizava e difamava as mulheres que se engajavam por uma causa na esfera pública.
Antes de retornar para a sua terra natal, Maria Quitéria pediu a dom Pedro 1º para escrever uma carta de próprio punho para o pai dela, Gonçalo, com o objetivo de convencê-lo a perdoá-la por meio do reconhecimento público de seu patriotismo. 
Mas nada foi capaz de abrandar a ira de Gonçalo, o que explica as escolhas da filha até o final de sua vida.

Maria Quitéria de Jesus morreu no anonimato, mas sua fama em razão de suas transgressões, incluindo as condecorações de dom Pedro 1º, logrou um desafio para a escrita de sua história e memória: como retratar uma mulher parda e do sertão baiano que subverteu todas as opressões para ocupar a linha de frente de uma guerra depois de tomar emprestada as roupas e a identidade de um homem?
Nas iconografias, temos algumas pistas. 
A primeira delas, intitulada "A Female Soldier of South America", é uma aquarela que foi produzida pelo artista inglês Augustus Earle, provavelmente em 1824.
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Em 2016, a Câmara Municipal de Salvador criou uma medalha militar e uma comenda em sua homenagem, destacando a importância regional do combatente e da própria Bahia na história nacional. Por fim, em 2018, ela foi declarada Heroína da Pátria Brasileira pela Lei Federal nº 13.697 e incluída no "Livro de Aço das Heroínas e Heróis da Pátria".

A história da baiana Maria Quitéria de Jesus resgatou o que há de melhor nesse país, em 2022. 
Ela nos convida a pensar a Independência do Brasil como um processo além do 7 de setembro e do eixo Rio-São Paulo.
Também nos oferece a possibilidade de conhecer a luta das mulheres que foram para a guerra por um mundo diferente daquele que as oprimia. Por fim, ela nos mostra que é possível derrotar a tirania de ontem e de hoje.
 

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